A força do setor de serviços e o papel da China na economia global

A recuperação da economia global pós-Covid passa por dois atores: o setor de serviços e a volta da China às compras. Embora a expectativa seja alta, a realidade é outra: a indústria e o setor de serviços chineses estão levando mais tempo para voltar ao ritmo antes da pandemia. Conversamos com especialistas sobre os setores que vêm se destacando, o papel da China, e como se comportam os preços da energia.

Para o economista-chefe da Porto Asset Management, José Pena, o setor de serviços é o que apresenta o melhor desempenho no momento. “A reabertura econômica favorece atividades como turismo, entretenimento, lazer, entre outras, severamente afetadas no início da pandemia. É o reflexo de uma demanda reprimida nos estágios iniciais da pandemia, porque a renda disponível entre os consumidores ainda se mostra bastante elevada”, afirma.

O boom das commodities, que era esperado com a saída da China da política de Covid-zero, ainda é esperado para 2023. “Os indicadores mais recentes apontam para um ritmo menos intenso do que o esperado. As incertezas sobre o crescimento econômico de curto e médio prazo nos Estados Unidos e na Europa também devem limitar o espaço de valorização dos preços da maioria das commodities”.

RECUPERAÇÃO LENTA NA CHINA

Na China, o surto de crescimento pós-Covid está perdendo força e a taxa de desemprego entre os jovens atingiu um nível recorde, sinalizando problemas para uma recuperação que se esperava impulsionar o crescimento global. Analistas acreditam que o governo precisa fazer mais investimentos para impulsionar a economia do país – e isso afeta até o desempenho no Brasil.

Para o economista chefe do Banco Fibra, Marco Maciel, a desaceleração chinesa é um dos principais fatores para a desvalorização da moeda brasileira, especialmente devido ao forte impacto que resulta na queda dos preços das commodities. “No âmbito externo, a principal força que explica a depreciação da moeda brasileira é a queda dos preços das commodities a partir de maio. A razão por trás disso reside na desconfiança de desaceleração da economia chinesa, ainda mais quando as expectativas de crescimento para 2023 se situam no forte intervalo entre 5,5% e 6,0%”, explica Maciel.

Os últimos resultados do índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) apresentou resultados abaixo de 50 nos últimos meses – e passou a se recuperar a partir de abril. “Parte da explicação [da desvalorização do real] de curto prazo reside no desempenho do PMI. Mesmo o segmento de construção, um dos mais altos, quando descontado dos gastos das províncias em infraestrutura, mostra que os gastos privados da atividade trilham também o campo da contração”, acrescenta Maciel.

O PAPEL DO ESTADO NA ECONOMIA CHINESA

Após enfrentar uma crise paralisante por conta da Covid-19, a segunda maior economia do mundo vem demonstrando sinais de retomada, embora alguns desafios persistam. Enquanto o consumo, serviços e investimentos em infraestrutura apresentam sinais de recuperação, observa-se uma desaceleração nos preços e um aumento nas poupanças bancárias.

Diante desse cenário, o governo chinês se comprometeu a intensificar o apoio à economia, visando superar um dos piores desempenhos em quase meio século. “A China está passando por mudanças significativas em sua economia, não apenas devido à pandemia, mas também por uma transformação em seu modelo econômico. Anteriormente, a China estava focada na exportação e buscava copiar o modelo de outros países, centralizando sua economia em grandes empresas. No entanto, agora o país está direcionando seus esforços para o mercado interno e o consumo doméstico”, destaca Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos.

Estima-se que a taxa de crescimento chinesa se estabilize entre 4% a 5% – mas o governo chinês possui ferramentas para estimular a economia e manter um crescimento considerável. “A China tem uma vantagem significativa ao ter o controle sobre sua economia e poder implementar medidas de estímulo quando necessário”, afirma Alves.
A tendência de investimentos em setores de alta tecnologia e manufatura avançada começou há algum tempo na China. “O país está buscando competir em setores que antes eram dominados por outros países, como a manufatura de produtos tecnológicos. Essa mudança mostra um avanço significativo em sua capacidade de liderança econômica”, ressalta Alves.

PETRÓLEO

O petróleo e seus derivados refletem o aquecimento do setor de serviços, especialmente no turismo. No caso da China, a demanda por derivados já superou o período pré-pandemia, segundo o economista para commodities do Capital Economics, Bill Weatherburn. “Indo mais fundo, isso foi amplamente impulsionado pela forte demanda por gasolina e diesel, em vez de um salto generalizado na demanda por todos os tipos de derivados de petróleo”, explica ele.

Por outro lado, o Ocidente não parece ainda estar em fase de aquecimento no que se refere à demanda por petróleo. “Os mercados de petróleo bruto e produtos refinados estão no início de uma crise, impulsionados por uma cadeia de abastecimento e logística cada vez mais fraturada. Nosso sistema econômico global é baseado no fluxo barato e fácil de energia através das fronteiras e oceanos. Quando as fronteiras fecham [sanções russas], essa cadeia começa a quebrar”, explica o diretor global do Rabobank, Jan Lambregts.

O que também impacta o mercado de petróleo é o crescimento da chamada energia verde, biodiesel e hidrogênio. “Taxas de juros mais altas apenas desencorajam ainda mais a perfuração especulativa e dispendiosas despesas de capital. É provável que a produção de petróleo dos norte-americanos atinja o pico antes de 2030, o que impulsionará ainda mais a busca por energias renováveis”, explica ele.

Para ele e seus analistas, até 2035, a oferta crescerá menos lentamente do que a demanda, até que ela caia completamente e mude para energias renováveis. “O petróleo bruto está nas últimas, mas isso pode ocorrer em dez ou trinta anos. Mas quando algo morre, ainda tem espasmos violentos. Esperamos o mesmo para os combustíveis fósseis, e a volatilidade reinará”, conclui.

Reportagem de Darlan de Azevedo, Julio Viana, Larissa Bernardes e Vanessa Zampronho

Edição: Vanessa Zampronho

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